segunda-feira, 25 de maio de 2009

A fabulosa fábrica de neuróticos

Participação de Maísa no Programa Silvio Santos

Basta um zapping. Uma rodada entre os canais abertos para comprovar a inadequação da programação televisiva para as crianças. No SBT, o apresentador Ratinho esquenta a audiência noturna, passando o bastão para séries enlatadas, incapazes de incitar nos pequenos qualquer tipo de reflexão aproveitável. Na Band, a situação piora. Entre berros e matérias que apelam para uma carnificina desenfreada, Datena destila comentários violentos, ilustrados por imagens fortes e impactantes. Trocando de emissora, na RedeTV!, é possível encontrar algo um pouco mais apropriado, mas ainda bem distante do ideal: os desenhos violentos do TV Kids. O problema está logo depois da sessão de animes, no apelativo TV Fama, com bastidores de ensaios sensuais, matérias fúteis e “flagras” sobre a vida dos “famosos”. Muda de estação. Na Globo, aquela velha fórmula de sempre: novela 1, jornal, novela 2. São folhetins um pouco mais leves, mas que trazem mensagens adultas e assuntos polêmicos. Na Record, um respiro: o antiquíssimo Pica Pau, seguido de outros produtos jornalísticos. Filtrando a grade das principais emissoras comerciais, das 17h às 20h, eis o resultado do que poderia ser assistido pela garotada: um cartoon da década de 50 e desenhos japoneses.

Desligar a televisão e propor outras atividades pode ser uma boa oportunidade de distrair as crianças no início da noite. No entanto, estamos no Brasil, um país subdesenvolvido, repleto de proletariados que trabalham muito além da carga horária ideal. Uma nação que cultua a babá eletrônica e que vê nela uma forma eficaz de ocupar a mente dos pequenos ociosos.

Nas redes abertas, as únicas alternativas viáveis de oferecer entretenimento de qualidade são as TVs Educativas, muitas vezes escondidas em sinais UHF. De fato, os canais comerciais vivem de faturamento. Investir em um público segmentado, no horário noturno, é arriscado e pode comprometer as vendas. Algumas dessas emissoras, contudo, já apostaram em dramaturgia para as crianças. Experiências ousadas que obtiveram boa audiência e excelente faturamento.

Os primórdios da dramaturgia infantil

A televisão ainda engatinhava. Algumas poucas telenovelas já haviam sido exibidas quando a TV Tupi lançou, baseada na obra homônima do escritor alemão Hans Erich Seuberlich, Angelika, voltada especialmente ao segmento infantil. O folhetim, exibido em 1959, era exibido ao vivo, em preto e branco. Como não havia videoteipe, não restaram registros desta obra. Apenas fotos e lembranças de uma produção ingênua, bem caprichada para a época.

As produções recentes: as novelas musicais de Cris Morena adaptadas no Brasil

Um orfanato, um triângulo amoroso, uma governanta mal amada e crianças à mercê da caridade alheia: os ingredientes perfeitos para um dramalhão repleto de clichês. Ledo engano. Essa fórmula, criada por Cris Morena em 1995, atravessou a Argentina, sua nação de origem, e conquistou diversos países, incluindo aqueles com forte vocação em dramaturgia, como o Brasil e o México. A trama, batizada de Chiquititas, teve a sua versão brasileira produzida entre 1997 e 2000, com cerca de 700 capítulos, exibidos com algumas pequenas pausas durante as férias. O grande destaque da trama exibida pelo SBT, contudo, não foi propriamente o seu enredo, mas sim os seus interessantes musicais, com temas lúdicos e rimas fáceis. O formato musicado de Morena obteve enorme aceitação. Empatia que gerou uma farta receita publicitária, com o lançamento de bonecos, revistas, peças de teatro, CDs e muitos outros badulaques com a marca da novela.

A mesma autora teve outra trama bastante popular no Brasil, desta vez na Band: Floribela. Voltado para todas as idades, o folhetim teve duas temporadas, aproximadamente 340 capítulos e dois álbuns com a trilha sonora original. O recurso do videoclipe, assim como em Chiquititas, foi amplamente utilizado. A linguagem jovem e o visual multicolorido inspiraram muitas crianças e pré-adolescentes, que tinham à disposição dezenas de produtos licenciados.

A dramaturgia infantil brasileira

No Brasil, várias novelas foram direcionadas para o público infanto-juvenil. Algumas delas contiveram apenas núcleos com a garotada, enquanto que outras assumiram completamente essa segmentação, com histórias criativas e alguns personagens fantasiosos. Destaque para o “Meu Pé de Laranja Lima” (Band) e “Caça Talentos” (Globo).

O trunfo da dramaturgia infantil brasileira, entretanto, está nos seriados, com forte destaque para a TV Cultura, ganhadora de diversos prêmios por suas produções. A trilogia Ra Tim Bum, do escritor e diretor Flávio de Souza, foi sucesso de crítica e já garante o seu status de “clássico”. Outros títulos merecedores de aplausos: O Menino Maluquinho, Cocoricó e Turma do Pererê. Até mesmo as TVs comerciais já tiveram seus dias de glória, com o Sítio do Picapau Amarelo, Vila Sézamo, Shazan, Xerife & Cia, além dos programas especiais, como os inesquecíveis Pluct Plact Zum e A Arca de Noé.

O diagnóstico

A TV aberta amarga uma das piores safras de atrações infantis da história. Destaque para o lastimável desempenho da pequena Maísa no Programa Silvio Santos. A menina tinha sua intimidade invadida todo domingo e frequentemente era ridicularizada no palco. Uma exposição desnecessária que pode trazer sérias consequências para a garota.

Diante deste cenário, fica a pergunta: existe diversão saudável na TV aberta? A resposta é afirmativa. Basta sintonizar as redes públicas. Nelas, é possível encontrar opções inteligentes de entretenimento que podem contribuir efetivamente para o desenvolvimento das crianças. Outra boa alternativa são os canais pagos. O lamentável é que, aqui no Brasil, o acesso aos bons serviços é cobrado. Em outras palavras: filho de pobre tem que se contentar com as imbecilidades da Xuxa. Deve enfrentar as filas do SUS quando ficar doente e se submeter à educação precária da rede pública. Essa é a realidade do nosso país. Os humildes são nutridos pela ignorância e pelo total esvaziamento intelectual, desde muito cedo. A televisão, mais do que entreter, passou a cumprir um caráter educacional. Função que nunca foi dela. Assim, em vez de contribuir na formação dos indivíduos, a TV deforma esse processo. Quer saber mais? Pergunte para a Maísa.

terça-feira, 5 de maio de 2009

O Diário Secreto do Superpop.

Luciana Gimenez

A nova música de Rita Cadilac, o lançamento do filme pornô de Julia Paes, o mais recente hit de MC Créu, as confissões de Thamny Gretchen e a banheira erótica da Mulher Moranguinho: estas são algumas atrações do Superpop, exibido de segunda a quinta-feira por Luciana Gimenez. Há quase dez anos no ar, o programa aposta no grotesco e no sensacionalismo, com temas – e factóides – polêmicos, geralmente acompanhados de um ar kitsch de jornalismo investigativo. O ambiente perfeito para sub-celebridades armarem os seus barracos e discutirem futilidades, que, na maioria das vezes, não levam ninguém a lugar algum.

Em sua primeira fase, ancorada por Adriane Galisteu, o Superpop teve uma roupagem jovem, com tons explicitamente inspirados na cultura pop. O DJ Zé Pedro, com seu vestuário extravagante compunha um mix bastante divertido. Mesmo com um orçamento enxuto, a pauta era criativa e variada, atraindo, segundo pesquisas daquele ano, mulheres entre 25 e 40 anos e médias em torno dos 3 pontos, significativos para uma emissora iniciante.

Dez meses depois, Galisteu, sem aviso prévio, trocou a RedeTV! pela Record. O golpe foi tão imprevisto que uma solução de emergência teve de ser arquitetada. Assim, Otávio Mesquita e Fabiana Saba foram escolhidos para cobrir o buraco. De mãos atadas, os diretores sentenciaram que a escolha da substituta de Adriane seria anunciada por votação direta dos telespectadores. Além de Luciana Gimenez, várias opções foram cogitadas, como Monique Evans, Astrid Fontenelle, Susana Werner, Rita Lee, Luana Piovani e Cátia Fonseca.

Apesar de não ter sido a candidata mais votada pelo público - que elegeu Monique Evans como preferida - Luciana foi a felizarda "por se encaixar mais com o perfil do programa". Logo em sua estréia, a ex-modelo foi implacavelmente achincalhada por causa dos deslizes que cometia contra a língua portuguesa, fruto de doze anos de vivência no exterior. Em entrevista para a Revista TPM, a apresentadora mostrou ter superado todas as críticas: “Eu mudei do Brasil com 16 anos e perdi a fluência. As pessoas que ‘jo­garam pedra na Geni’, hoje se sentem cul­padas e têm um carinho extra por mim” - completa.

Questionada sobre a qualidade dos temas exibidos no palco, Luciana responde com ironia. Diz não se tratar de baixaria, mas de conflito social. Relembra, ainda, as importantes entrevistas e matérias que realizou. Destaques para Fernando Col­lor, Britney Spears, Bryan Adams, Mi­ck Jagger e Marta Suplicy. Defende também já ter privilegiado pautas de interesse público, como parto na á­gua, HPV e cân­cer de mama. Esses assuntos, contudo, não rendem bons índices no Ibope, segundo o parecer da apresentadora.

A receita da “popularidade” é previsível: sensacionalismo barato, manchetes chamativas e pautas extravagantes. Para acalorar o espetáculo, participam modelos, parentes de famosos, ex-BBBs, garotas de programa, médicos e especialistas, discutindo, juntos, temas polêmicos, como homossexualidade, prostituição, cirurgia plástica e religião. Às vezes, o debate toma rumos inadequados, com opiniões de quem pouco ou nada sabe do que está falando. Patético!

Outra característica reincidente é a predileção por certos convidados, como Thammy Gretchen. A filha da rainha do rebolado sempre entra em cena para abordar a sua orientação sexual: desabafo, desculpas à mãe, filme pornô gay, desejos e relacionamentos. Com intuito de apimentar a contenda, a produção escala alguns “antagonistas”, que se prestam a espezinhar a moça, com comentários homofóbicos. Arma-se, então, um barraco esdrúxulo, com direito à gritaria da platéia e às caras de bocas de Gimenez.

O programa conta ainda com vários outros quadros, como “O Diário Secreto”, um rascunho do “Arquivo Confidencial” do Faustão. Só que, em vez de Regina Duarte no papel de homenageada, o centro das atenções é Bruna Surfistinha. Há também os desfiles de moda, às quartas-feiras, em que moças desfilam lingeries no palco. A união perfeita do merchandising com o apelo erótico. Em seguida, entra Ronaldo Ésper, com a sua avaliação da roupa dos famosos. O estilista, depois do caso do roubo de vasos no cemitério, ganhou um pouco de senso do ridículo, mas não o suficiente para impedi-lo de dançar suas músicas. Por fim, tem o insuportável “Popparazo”, um rapaz que persegue as celebridades com a sua câmera. Nas imagens, flagras imperdíveis, como a Gretchen comendo pastel de carne, Vivi Fernandes tomando caldo de cana com um “suposto affair”, e outras pérolas do gênero.
Crééééu

Na tentativa de elevar o nível da atração, a RedeTV! buscou promover, em dias específicos, pautas jornalísticas e investigativas, como "Na mira da mídia”, um quadro que mostra apenas os casos mais conhecidos e batidos da semana. Destaque para a entrevista de Alexandre Jatobá, pai de Anna Carolina Jatobá, entrevistado sobre o suposto crime que a filha teria cometido. Outra edição controvérsia foi protagonizada pelos sargentos Laci Marinho de Araújo e Fernando de Alcântara Figueiredo. O interrogatório se transformou em um show, quando ao vivo, foi informada a prisão de Araújo pelo Exército.

Esta postura mais séria do Superpop, contudo, não cobriu com sucesso nem a proposta inicial de entretenimento, tampouco a cobertura de informações jornalísticas. Assim, a direção resgatou, sem grandes inovações, um velho formato, que fez muito sucesso em meados da década de noventa: a “banheira”. Em vez da água, todavia, apostaram em um novo ingrediente: o chantili. Tudo para justificar a presença da insinuante Mulher Moranguinho, incumbida de impedir com que os rapazes recolham as frutas. Um verdadeiro show pornô, com picantes closes ginecológicos. O mesmo esquema do falecido quadro do Gugu, mas em um horário bem mais permissivo.

O mais curioso é que o Superpop não é tão povão como sugere seu nome. Seu perfil é altamente qualificado, assistido diariamente por cerca de 250 mil telespectadores (só na Grande São Paulo), de clas­ses predominantemente A e B, segundo o Ibope. A audiência também é interessante, uma das maiores da RedeTV!. É o típico programa que as pessoas escondem acompanhar. Muitas delas se dizem abduzidas no momento do zapping. Pura balela! As madames também apreciam uma boa baixaria na TV, desde que salvaguardadas no silêncio de suas salas. O trash seduz. Quem nunca foi atraído que atire a primeira pedra.