A partir do dia 4 de maio, diariamente, das 16h30 às 17h30, o SBT vai transmitir o novo “Casos de Família”, bem diferente da estrutura assistencial que a competente jornalista Regina Volpato levava ao ar. A ordem agora é chocar, inflamar discussões, armar o barraco. Saem os casos humanos narrados de forma civilizada, entram as gritarias. É o retorno de Christina Rocha, que acaba de sofrer uma verdadeira "venezuelização", já que a proposta é ser o mais fiel possível ao formato adquirido pela produtora Venezuelana.
Depois que Volpato abandonou o programa, desgostosa com as imposições que lhe foram feitas, o SBT partiu em busca de uma substituta que se encaixasse ao novo perfil. Com a saída de Regina, a emissora produziu pilotos com Olga Bongiovanni, Claudete Troiano, Márcia Dutra e Christina Rocha. A palavra final, como sempre, foi a de Silvio Santos, que elegeu a ex-apresentadora do “Aqui Agora” para ancorar a atração.
Historicamente, o programa apresenta perfil feminino, com predomínio das classes ABC e faixa etária acima de 25 anos. Um segmento bastante atrativo para o mercado publicitário. Estes dados, contudo, são referentes aos tempos de Volpato, que mediou a atração de maio de 2004 até março de 2009. Desde que estreou no comando de “Casos de Família”, Regina rompeu preconceitos e provou que é possível manter a elegância num “telebarraco” e não explorar o drama de pessoas humildes, que se prestam a contar na TV o que deveria ficar restrito às suas casas. A ordem agora, contudo, é seguir o caminho inverso: provocar escândalos, chamar atenção e atrair audiência, seja ela qual for. E o antigo telespectador? Será atraído pela nova proposta? E os anunciantes? Eles vão querer associar suas marcas a este tipo de conteúdo?
Esses resultados estimularam uma mudança de postura. De 1983 a 1987, a emissora investiu em programas populares, mas já aliados a uma preocupação com a qualidade. Estratégia intensificada entre 1988 e 1990, com a contratação de Boris Casoy, Jô Soares e Carlos Alberto de Nóbrega. Nesse período estrearam "Aqui Agora", "Programa Livre", "Jô Onze e Meia”, "A Praça é nossa" e "Cinema em Casa". Com uma grade qualitativa, contudo, a Rede experimentou um decréscimo na sua participação em audiência, caindo para 22%. Em compensação, pulou para 15% de no share publicitário. Prova de que os números do IBOPE, a comercialização e o prestígio nem sempre andam juntos.
Em resposta à ascensão comercial da Record, a partir de 2004, o SBT tentou re-qualificar sua grade com maciços investimentos no jornalismo e na dramaturgia. Aos poucos, a emissora sofisticou seu casting e perdeu parte do apelo popular. Tal atitude, todavia, veio acompanhada de uma substancial queda na audiência.
Se antes aquele estilo pop do SBT tinha um ar cult, hoje envelheceu. Tornou-se apenas brega – o que explica em parte o esvaziamento da identidade da emissora. A estréia do novo “Casos de Família” é um desses exemplos desesperados de voltar no tempo. Troca o perfil, substitui a apresentadora. Muda também o telespectador qualificado, que migra para outras propostas mais interessantes – e cada dia mais escassas na TV aberta. Só falta contratarem o João Kleber para acelerar a metástase da grade vespertina, já convalescente desde o regresso de Márcia Goldschmidt. É o mundo cão ressurgindo das cinzas, mais forte do que nunca.