sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Pegadinhas broxantes: e a TV conhece o fundo do poço.

Reprodução da TV

Na madrugada de sábado para domingo, logo depois da reprise do CQC, a Band exibe o Cine Privé. Em cartaz, filmes baratos e duvidosos, muitos deles já populares, como as estripulias da fogosa Emanuelle. Uma orgia mental para telespectadores que aprendem desde cedo o que é banalização do sexo e como se perpetua a imagem da mulher objeto. O horário é permissivo, 1h45. Ainda assim, tais produções estão em exibição, encruadas na programação aberta, “livres” para todas as idades, sem qualquer filtro. Basta ligar a TV. Neste caso, o apelo erótico é explícito. Menos mal. O problema acontece quando o produto vem com uma falsa embalagem, sugerindo uma proposta humorística, em um horário absolutamente inadequado. Não, caro leitor, não se trata de “A Praça é Nossa”, tampouco do “Superpop”. O buraco é mais embaixo. Quando todos pensavam que a TV já havia conhecido o fundo do poço, Silvio Santos chega, sorrateiramente, e solta mais uma de suas pilhérias. Infame, por sinal. Sem muito estardalhaço, estreou no SBT, no dia 14 de setembro, às dez da noite, o programa “Pegadinhas Picantes”. Uma série de televisão caracterizada por cenas de humor em que as pessoas são pegas de surpresa ao observar situações bizarras de nudez.




Produzidos na Ucrânia pela AFL Productions e Comedy Central, sob a alcunha “Naked and Funny”, os esquetes apostam em um erotismo gratuito e vazio, com atores trajando sungas com enchimento frontal e modelos nuas em situações “inusitadas”. Entre os quadros, alguns desenhos animados sugerem sexo implícito, com o objetivo de apimentar a atração. Destaque especial para a tradução dos títulos da versão brasileira que, de tão ruins, chegam a ser engraçados.


Em “Pegadinhas Picantes” nada é falado, o que deixa o programa ainda mais esdrúxulo. Acompanhados por música e onomatopéias, os quadros unem o erotismo ao pastelão, não se adequando perfeitamente em nenhuma das duas categorias. O resultado é patético. O áudio da reação das vítimas não é capturado, sendo substituído por gestos de mímica. É o tipo de programa que poucos telespectadores assumem acompanhar. Dá vergonha de admitir. No entanto, os dados apontam para uma realidade diferente. Na faixa das 22h, os esquetes rendiam até 10 pontos no Ibope.

O SBT já tem tradição em inserir o erotismo em alguns de seus programas. Difícil esquecer da polêmica e controversa banheira do Gugu, do insinuante “Cocktail”, apresentado por Miele na década de 80, e do horrendo humorístico “Sem Controle”, rifado da programação há poucos anos. Atrações que atraíram certa audiência, mas que sujaram a credibilidade da emissora e afastaram muitos anunciantes.

Com a mudança das dez para as onze da noite, na segunda-feira (26), as "Pegadinhas Picantes" perderam quatro pontos no Ibope. Às 23h, o programa caiu para 06 pontos. A troca de horário foi por conta de reclamações de telespectadores. Às 22h, o SBT colocou no ar "Boletim de Ocorrência", com Joyce Ribeiro. Outra atração popularesca para tapar o buraco da programação. Que convoquem o Chaves, então. Sai mais barato e dá retorno.

Silvio Santos adora polêmicas. E responde aos ataques com sarcasmo. Foi assim que o recado foi dado aos que “não gostam de ver belas garotas à vontade” na TV, através de uma chamada irônica, comunicando a troca de horário das “Pegadinhas Picantes”. Tudo isso leva a crer que o desejo de estabilizar a grade da emissora cai por terra quando as birras do patrão falam mais alto. Ego ferido. Como se não bastasse o terrorismo gravado, editado e exibido com a Maísa, os escrachos com os convidados, como o recente episódio com a dançarina Carla Perez, agora Silvio Santos aposta na vulgaridade para alavancar os índices. Audiência barata que pouco ou nada vai agregar à programação. Para alguns pode até ser excitante. Mas para o departamento comercial e para a imagem institucional da emissora, esse decreto é broxante.

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Medo do escuro: o futuro do jornalismo impresso.

Corram para as suas casas, a mentira invadiu a terra.

O novo tende sempre a ser uma ameaça. O medo do desconhecido, do escuro. De fato, estar longe da zona de conforto é sempre uma insegurança. Assim como envelhecer. A vida, por si só, já nos surpreende com intimidações desde que nascemos. Sair do ventre, por exemplo. É um trauma. Tiram-nos do ambiente em que vivemos e nos colocam em um outro, muito mais frio, claro e barulhento. Depois vem o primeiro dia de aula: crianças jogadas aos leões, forçadas à convivência em sociedade. Chega o vestibular. Aos dezoito anos, um adolescente com piercing na sobrancelha tem que decidir se vai ser médico ou jornalista. Mais uma ruptura capaz de desviar todo o curso de uma carreira. Ou seja, viver é mudar. Mudar é viver.

Depois de um belíssimo prólogo à Pedro Bial, vamos ao ponto. Porque diabos as pessoas temem tanto o desconhecido, uma vez que ele faz e continuará fazendo parte da existência humana? Monologada a introdução da tragédia, vamos aos fatos: jornalistas tradicionais estão em pânico temendo o fim do jornal impresso. O fim do coronelismo das rotativas e do monopólio da informação.

Serei sincero. Até porque eu – como proprietário deste blog – tenho total liberdade de escrever o que eu quiser, da maneira que desejar. Esse medo da inevitável queda do papel noticioso é fundamentado? Não seria receio de uma nova concorrência intelectual, de novos entrantes do mercado, de uma gurizada que já nasceu dominando a tecnologia? A força motriz dessa discussão – assim como em todos os momentos de ruptura da história – é econômica e ideológica. A mesma que fez a Igreja abominar a democratização do mundo impresso. São apenas grandes conglomerados inquietos com a mudança de valores (espaço reservado para a dubiedade).

A notícia ganha novas fontes. Agora ela pode vir do melhor amigo, da namorada, do pai. E o melhor: instantaneamente. Nesse contexto, surgem jornalistas apocalípticos denunciando o fim da profissão. Corram para as suas casas, o Satanás agora é porta-voz. A informação se desfez, a mentira chegou para amaldiçoar os seus lares. Pausa. Um tempo para respirar e enumerar alguns fatos: o ato de dar e receber notícia mudou. O receptor – estou falando do letrado, que tem acesso à informação - agora tem milhões de possibilidades de verificar a fonte. E é aí que os bons jornalistas e os bons veículos se destacam – e garantem o seu espaço no mercado, mesmo com a isenção da obrigatoriedade do diploma, com o crescimento das mídias sociais e com todos os experimentos que provém a democratização da informação. Não há motivo para tanto alarde, caros amigos. Os bons terão seus lugares ao sol. A sociedade não precisa de jornais. Precisa de jornalismo.

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

A fantástica morte de Silvio Santos.

Silvio Santos, 78 anos


Curto e grosso: e se Silvio Santos morresse esta noite? Sim, caro leitor, Senor Abravanel é um ser humano que, como todos de sua espécie, cumpre um ciclo vital. Se Michael Jackson desapareceu, outros ícones também podem perecer de um dia para outro. Reflitam: como seria, melhor dizendo, como será (porque fatalmente vai acontecer uma hora) o ritual de passagem do Homem do Baú? Qual será a postura da Rede Globo? Vale lembrar o episódio em que o apresentador foi o tema da Escola de Samba Tradição, transmitido pela emissora carioca, com profissionalismo e respeito. Como transcorrerá a rotina na sede da Anhanguera? Como serão os domingos sem Silvio Santos?


Listemos alguns fatos relevantes: Senor Abravanel é um senhor de 78 anos, um representante da melhor idade. Por mais lúcido que possa parecer, ele, assim como qualquer indivíduo da sua idade, tem limitações físicas. E que tendem a aumentar com o tempo. O fascínio pela figura que Silvio exerce, contudo, nos faz esquecer que, ali no palco, junto às colegas de trabalho, tem um homem quase octogenário.

A vitalidade de Silvio Santos é, de fato, impressionante, assim como o seu poder de virar notícia. Tudo isso preservando ao máximo a sua vida pessoal. Questionado pela revista Veja, em 2000, sobre a sua aposentadoria – e provável ausência nos negócios do Grupo, o apresentador foi taxativo: “Os executivos dizem que se eu parar o SBT regride, o Baú não vende. É tudo mentira. Os executivos falam isso porque eles ganham bônus e acham que as coisas são mais fáceis com o Silvio Santos lá, porque o Silvio Santos é um bom vendedor etc. Mas eu acho que o SBT não pode depender mais do Silvio Santos. A Globo não é sinônimo de Tarcísio Meira, Regina Duarte, Xuxa, Faustão. Da mesma forma, o SBT não tem de ser sinônimo de Silvio Santos, Hebe Camargo, Gugu ou Jackeline. O SBT tem de ser uma linha de produção. Se o artista convier ao SBT, ótimo. Se não, troca-se e não acontece nada com a emissora.”

Há alguns meses, o SBT sofreu um grande desfalque, a saída de Gugu Liberato para a Record. Muita gente – inclusive eu, que publiquei uma coluna sobre o assunto – questionou sobre o tamanho do estrago que essa transferência causaria à imagem da emissora. Eis que Silvio ressurge das cinzas e promove grandes contratações, provando a todos que a pipa do vovô ainda sobe. E que ainda há tesão pelo veículo impulsor de todos os negócios do Grupo.

Há alguns meses, o site O Fuxico, especializado em notícias de celebridades, divulgou, em 22 de maio, a morte de Silvio Santos. Segundo a notícia, o empresário teve fortes dores no peito durante a gravação o quadro Fale com a Maisa. “Levado para o Hospital Albert Einstein, ele faleceu”, afirma o texto. A nota, contudo, era falsa. O motivo: invasão hacker no servidor do site.

Boatos envolvendo a vida do patrão, entretanto, não são recentes e nem exclusivos do ambiente virtual. Há algumas décadas, circulava no Brasil uma publicação sensacionalista com a manchete de que Silvio Santos estaria careca. Outro episódio, ainda mais fatídico, foi a controversa entrevista concedida à Revista Contigo, que estampava, na capa, que o apresentador estava doente, com mais seis anos de vida, e que o SBT havia sido vendido para a Televisa e para o Boni.

A princípio, a própria revista suspeitou que Silvio Santos estava fazendo uma galhofa. Amparada judicialmente e com a entrevista gravada, a publicação inseriu as declarações do dono do SBT ipsis literis. A “pegadinha” teve a magnitude de uma bomba atômica e comprovou a podridão e a irresponsabilidade das “mídias das fofocas”. O site Cocadaboa, dias depois, afirmou ter inventado a história. Disse, ainda, ter arranjado uma pessoa com a voz similar à de Silvio Santos e ludibriado a revista Contigo. Outra sandice. Era mais um boato revertendo outro boato.

Tarde demais. A semente da discórdia estava plantada e a árvore da desinformação em plena reprodução. A cada minuto surgia uma versão nova, um desmentido, uma confirmação. “O ‘monstro’ saiu de nosso controle e assumiu vida própria. O falatório assumiu várias formas e acabou ficando irreconhecível até para nós.” - afirmaram os editores do Cocadaboa, em matéria publicada no site. “Toda a ‘mídia parasita’ ajudou. Criamos o assunto descartável para entreter as vidas vazias dos coitados que passam a tarde inteira assistindo televisão”.


Um fato é certo. Falar de Silvio Santos vende, gera notícias e boatos. E o mais cômico é que, por trás disso, tem um empresário fanfarrão, que alimenta muitas hipóteses e faz questão de estar da boca do povo. Talvez sua morte seja mesmo refletida de maneira apoteótica. Será a passagem do maior e mais popular profissional da comunicação brasileira.


Como será a sua vida sem o Silvio Santos? Eu mesmo não sei responder, mas tenho certeza que não vai passar batida. Uma coisa, contudo, eu tenho convicção: um dia ele vai partir desta para uma melhor. Também não duvido que peguem esta coluna e publiquem minha “previsão”. A visão do publicitário-mãe-dinah em letras garrafais: “SILVIO SANTOS VAI MORRER”. Não duvido mesmo. Tem otário pra tudo.

quinta-feira, 23 de julho de 2009

O bê-á-bá do broadcasting: os hábitos de consumo.

Mylena Ciribelli, apresentadora do "Esporte Fantástico", recém-estreado.

Palavras de um grande diretor de comercialização e marketing, Álvaro Iahnig: “TV é hábito”. Sentença que ouvi exaustivamente durante os três anos que trabalhei em uma rede de televisão. Praticamente uma lavagem cerebral. O óbvio ululante do planejamento em broadcasting. Tão evidente e intuitivo, mas que alguns executivos parecem desprezar. O resultado do descaso: grades voadoras, programas que estréiam e são cancelados antes de completarem um mês no ar e – principalmente – um enorme desrespeito ao telespectador.

Criar e desenvolver hábitos de consumo são práticas que a Rede Globo adota – com sucesso - desde os anos 60. A conseqüência dessa sistematização é a notável fidelização de audiência que a emissora mantém, mesmo com o avanço das redes concorrentes. Dados do Painel Nacional de Televisão do mês de junho apontam para uma confortável liderança para a Vênus Platinada, com 16,8 pontos de média diária, ante 5,7 da Record e 4,9 do SBT.

A diferença da grade da Rede Globo para suas duas principais concorrentes é justamente a previsibilidade do que vai ao ar. Ou seja, o telespectador sabe qual será a próxima atração. Já está consolidada no consciente coletivo brasileiro a disposição da programação: Vale a Pena ver de Novo, Sessão da Tarde, Malhação, novela das seis, das sete, Jornal Nacional, novela das oito e linha de shows. É sempre assim, necessariamente nessa ordem. Experimente agora citar a do SBT ou a da Record.

A rede de Silvio Santos experimentou o dissabor de perder público devido às inconstâncias na programação. Uma estrutura tão volúvel que se tornou um mistério para o telespectador. O disse-que-disse tomou proporções maiores quando o patrão – em um dos seus espasmos criativos – resolveu fechar a assessoria de imprensa da casa, cerrando o contato com os formadores de opinião. Uma espécie de Ato Institucional: centralizador, ditador e insano. Tal postura deixou não somente o público perdido, mas também os funcionários do canal. Fato que rendeu um embaraçoso episódio no principal telejornal da emissora: a apresentadora, que deveria anunciar a atração seguinte, ficou embasbacada, sem imaginar o que ia ao ar. A produção tampouco. Quem salvou a cena foi o experiente Hermano Henning, que finalizou o assunto com um sorriso amarelo.

Ao que parece, Senor Abravanel aprendeu a lição. Hoje já dá para supor a programação noturna do SBT: linha de shows 1, telejornal, novela e faixa especial. Até quando a grade será mantida é uma incógnita, mas o homem do Baú dá indícios de que vai honrar a fórmula. A não ser que ele acorde com o dente doendo. Aí tudo pode mudar. Ou não. Vai saber.

No mesmo caminho está a Rede Record, cada dia mais inconstante. De acordo com a coluna Outro Canal, a emissora mudou a sua grade em São Paulo pelo menos 24 vezes num período de 57 dias. As alterações começaram em maio, quando Geraldo Luís deixou de apresentar o "Balanço Geral" paulista para dar lugar à edição carioca. Entre as reformas, houve também a ampliação do "Hoje em Dia" e mudanças no horário do "Domingo Espetacular" e do "Repórter Record" por conta da estreia de "A Fazenda", em 31 de maio. O caso mais recente foi o “Esporte Espeta...digo, Esporte Fantástico” que, em sua terceira apresentação, teve seu horário radicalmente corrompido, passando do meio dia para às 8h30.

Todas essas alterações repentinas expõem insegurança e imaturidade por parte dos executivos das redes de TV. Uma aflição desenfreada por resultados financeiros e comerciais que pode afetar um importante elemento desse negócio: a credibilidade. Diante de uma derrapada no Ibope, mais vale fazer como a Globo, que leva a temporada até o término do seu ciclo (mesmo que antecipado) para somente depois cancelá-la. A série “Tudo Novo de Novo” e a malfadada novela “Negócio da China” são alguns exemplos. O respeito, assim como nas relações pessoais, deve se refletir também profissionalmente. Essa perda pode ser irreparável. Pensando bem, agora entendo meu ex-diretor, quando bradava incansavelmente que TV é hábito. Uma repetição salutar para todos os departamentos. O bê-á-bá da administração, que muitas vezes se perde no meio do caminho.

quarta-feira, 8 de julho de 2009

Na velocidade da internet: uma rápida análise do Leitura Dinâmica.

Renata Maranhão


Água e azeite: eis a relação do jornalismo da RedeTV! com o restante da programação do canal. Chega a ser paradoxal. A mesma emissora que transmite uma grade chula, sustentada, sobretudo, por sensacionalismo, veicula também produtos exemplares. De fato há uma certa indissolubilidade nesta estrutura. Uma postura bastante saudável, visto que essa separação preserva e salvaguarda o departamento de comunicação social da casa. Hoje, em rede nacional, são transmitidos quatro telejornais: RedeTV News, É Notícia, Good News e as duas edições do Leitura Dinâmica, que apresenta os principais fatos do dia de forma rápida e concisa.

Exibida de segunda a sexta-feira, no fim de noite, a revista eletrônica da RedeTV! destaca-se por seus avançados recursos gráficos e cenários virtuais de última geração. Em pauta, notícias do Brasil e do mundo, política, números do mercado financeiro e curiosidades, acompanhados de uma dose de opinião. Tudo abordado de forma muito leve e agradável, com amplo espaço dedicado para a cultura e para o entrenimento.

O Leitura Dinâmica estreou em 21 de novembro de 1999, com a proposta de ser uma revista dominical. Em sua primeira fase teve a apresentação de Milton Jung. Na época, contava com a participação de Daniel Piza, que mantinha uma coluna de críticas. A aceitação do público ao formato inovador fez com que a atração passasse a ser diária em outubro de 2001. Assim, ganhou reforços na equipe de produtores e editores e uma nova apresentadora, Rita Lisauskas. Na seqüência, vieram Cláudia Barthel e, a partir de janeiro de 2004, Renata Maranhão, que ocupa o posto até hoje.

Em 2008, o Leitura Dinâmica ganhou uma versão matutina, ancorada inicialmente por Cristina Lyra e, posteriormente, por Cláudia Barthel. Sucesso de crítica, o programa também é um êxito comercial. Configura-se como o quinto maior faturamento da RedeTV! e como a marca mais desejada da emissora, na opinião do mercado.

O título da revista eletrônica remete à proposta da leitura dinâmica, um método que consiste basicamente na assimilação das frases de forma rápida e clara, mantendo o entendimento apesar da velocidade. O formato lembra a estrutura textual da Internet, concisa e direta. Tal característica atrai, sobretudo, as classes mais privilegiadas, com acesso à tecnologia.

Na pauta, além das notícias breves, há também espaço para o entretenimento: moda, personalidades, cinema, artes, divertimento eletrônico e internet. Neste aspecto, o jornalístico inova ao abordar música alternativa e novas mídias para pessoas que entendem do assunto, sem subestimar a inteligência do telespectador. Por isso, diferencia-se dos jornais tradicionais, que investem em pautas pasteurizadas e de “interesse comum”. Para os editores do Leitura Dinâmica, o receptor não é um “Homer Simpson”. Há uma preocupação formal e estética com o conteúdo, sem melindres de se enquadrar como uma atração segmentada.

Na contra-mão dos produtos rasos da RedeTV!, o Leitura Dinâmica é uma escola quando o assunto é entretenimento cultural. Uma prova de que é possível desenvolver uma pauta de qualidade, sem envolver gastos exorbitantes e nem apelar para a baixaria ou para o sensacionalismo barato. De fato, há um abismo cultural entre a divisão de jornalismo do canal e o restante da programação. Um departamento com anticorpos que resistem a uma grade doente, infectada por atrações religiosas de quinta categoria, tele-vendas e programas de fofocas que sequer cutucam nossas mentes a alguma atividade cerebral. Pensando bem, que continue assim. Cada um no seu quadrado.

quinta-feira, 18 de junho de 2009

Nos bastidores da Anhanguera


O circo está armado. Especulações por todas as partes, um disse-que-disse generalizado, um bafafá desenfreado nos bastidores. Eis o mais novo capítulo da competição entre a a Record e o SBT. A disputa pelo passe de Gugu Liberato, de 50 anos. A peleja, entretanto, vai além de uma mera questão de valores. Assume um forte valor simbólico. Trata-se de um dos pilares da emissora da Anhangüera. A possível perda pode acarretar em um sério dano institucional e representar a derrocada da identidade da emissora de Silvio Santos, que vem sofrendo de sucessivos arranhões em sua imagem.

A proposta da Record é generosa: renda mensal de R$ 3 milhões, um programa dominical e uma série de benefícios, como aumento do espaço na grade nos próximos oito anos, período do contrato. Especula-se, ainda, que a emissora de Edir Macedo oferece um espaço na Record Internacional, o canal brasileiro mais acessível no exterior. Caso aceite, Gugu poderá ser visto em 160 países. O vínculo do apresentador com o SBT encerra em março de 2010. Caso optem por quebrar o contrato, a rescisão gira em torno de R$ 15 milhões.

Situação semelhante aconteceu em agosto de 1987. No auge do extinto “Viva a Noite”, Gugu assinou um contrato com a Rede Globo. A notícia gerou polêmica e estampou tablóides e revistas de fofoca. Inconformado, no sábado de Carnaval de 1988, o empresário Silvio Santos foi pessoalmente à sala do dono da emissora carioca, Roberto Marinho, para pedir a permanência do apresentador no SBT. Nesta negociação, Augusto Liberato recebeu uma proposta milionária: um salário dez vezes maior, parte da programação de domingo e ganhos com publicidade.

A relação do apresentador com Silvio Santos é antiga. Gugu começou na televisão aos quatorze anos, como assistente de produção no Domingo no Parque. Desde então, passou a ter sua imagem vinculada ao homem do Baú. Sua passagem no SBT é marcada por altos índices no Ibope, em especial no final dos anos 90 e início dos anos 2000, quando emplacou sucessivas vitórias contra a Rede Globo. Ainda hoje é a maior audiência da casa.

Para o SBT, perder o apresentador implica em abrir mão de parte de sua história. Significa virar a página de uma parceria que já fez grande sucesso e que ainda gera uma excelente receita publicitária. E o pior: fomenta ainda mais o status de um canal decadente. Segurar o moço loiro na Anhangüera é uma questão de orgulho. Talvez uma necessidade de sobrevivência. De algum vínculo com o SBT do passado, uma rede popular, inovadora e até inconsequente, que enfrentou uma hegemonia pesada com uma programação criativa e diferenciada.

segunda-feira, 25 de maio de 2009

A fabulosa fábrica de neuróticos

Participação de Maísa no Programa Silvio Santos

Basta um zapping. Uma rodada entre os canais abertos para comprovar a inadequação da programação televisiva para as crianças. No SBT, o apresentador Ratinho esquenta a audiência noturna, passando o bastão para séries enlatadas, incapazes de incitar nos pequenos qualquer tipo de reflexão aproveitável. Na Band, a situação piora. Entre berros e matérias que apelam para uma carnificina desenfreada, Datena destila comentários violentos, ilustrados por imagens fortes e impactantes. Trocando de emissora, na RedeTV!, é possível encontrar algo um pouco mais apropriado, mas ainda bem distante do ideal: os desenhos violentos do TV Kids. O problema está logo depois da sessão de animes, no apelativo TV Fama, com bastidores de ensaios sensuais, matérias fúteis e “flagras” sobre a vida dos “famosos”. Muda de estação. Na Globo, aquela velha fórmula de sempre: novela 1, jornal, novela 2. São folhetins um pouco mais leves, mas que trazem mensagens adultas e assuntos polêmicos. Na Record, um respiro: o antiquíssimo Pica Pau, seguido de outros produtos jornalísticos. Filtrando a grade das principais emissoras comerciais, das 17h às 20h, eis o resultado do que poderia ser assistido pela garotada: um cartoon da década de 50 e desenhos japoneses.

Desligar a televisão e propor outras atividades pode ser uma boa oportunidade de distrair as crianças no início da noite. No entanto, estamos no Brasil, um país subdesenvolvido, repleto de proletariados que trabalham muito além da carga horária ideal. Uma nação que cultua a babá eletrônica e que vê nela uma forma eficaz de ocupar a mente dos pequenos ociosos.

Nas redes abertas, as únicas alternativas viáveis de oferecer entretenimento de qualidade são as TVs Educativas, muitas vezes escondidas em sinais UHF. De fato, os canais comerciais vivem de faturamento. Investir em um público segmentado, no horário noturno, é arriscado e pode comprometer as vendas. Algumas dessas emissoras, contudo, já apostaram em dramaturgia para as crianças. Experiências ousadas que obtiveram boa audiência e excelente faturamento.

Os primórdios da dramaturgia infantil

A televisão ainda engatinhava. Algumas poucas telenovelas já haviam sido exibidas quando a TV Tupi lançou, baseada na obra homônima do escritor alemão Hans Erich Seuberlich, Angelika, voltada especialmente ao segmento infantil. O folhetim, exibido em 1959, era exibido ao vivo, em preto e branco. Como não havia videoteipe, não restaram registros desta obra. Apenas fotos e lembranças de uma produção ingênua, bem caprichada para a época.

As produções recentes: as novelas musicais de Cris Morena adaptadas no Brasil

Um orfanato, um triângulo amoroso, uma governanta mal amada e crianças à mercê da caridade alheia: os ingredientes perfeitos para um dramalhão repleto de clichês. Ledo engano. Essa fórmula, criada por Cris Morena em 1995, atravessou a Argentina, sua nação de origem, e conquistou diversos países, incluindo aqueles com forte vocação em dramaturgia, como o Brasil e o México. A trama, batizada de Chiquititas, teve a sua versão brasileira produzida entre 1997 e 2000, com cerca de 700 capítulos, exibidos com algumas pequenas pausas durante as férias. O grande destaque da trama exibida pelo SBT, contudo, não foi propriamente o seu enredo, mas sim os seus interessantes musicais, com temas lúdicos e rimas fáceis. O formato musicado de Morena obteve enorme aceitação. Empatia que gerou uma farta receita publicitária, com o lançamento de bonecos, revistas, peças de teatro, CDs e muitos outros badulaques com a marca da novela.

A mesma autora teve outra trama bastante popular no Brasil, desta vez na Band: Floribela. Voltado para todas as idades, o folhetim teve duas temporadas, aproximadamente 340 capítulos e dois álbuns com a trilha sonora original. O recurso do videoclipe, assim como em Chiquititas, foi amplamente utilizado. A linguagem jovem e o visual multicolorido inspiraram muitas crianças e pré-adolescentes, que tinham à disposição dezenas de produtos licenciados.

A dramaturgia infantil brasileira

No Brasil, várias novelas foram direcionadas para o público infanto-juvenil. Algumas delas contiveram apenas núcleos com a garotada, enquanto que outras assumiram completamente essa segmentação, com histórias criativas e alguns personagens fantasiosos. Destaque para o “Meu Pé de Laranja Lima” (Band) e “Caça Talentos” (Globo).

O trunfo da dramaturgia infantil brasileira, entretanto, está nos seriados, com forte destaque para a TV Cultura, ganhadora de diversos prêmios por suas produções. A trilogia Ra Tim Bum, do escritor e diretor Flávio de Souza, foi sucesso de crítica e já garante o seu status de “clássico”. Outros títulos merecedores de aplausos: O Menino Maluquinho, Cocoricó e Turma do Pererê. Até mesmo as TVs comerciais já tiveram seus dias de glória, com o Sítio do Picapau Amarelo, Vila Sézamo, Shazan, Xerife & Cia, além dos programas especiais, como os inesquecíveis Pluct Plact Zum e A Arca de Noé.

O diagnóstico

A TV aberta amarga uma das piores safras de atrações infantis da história. Destaque para o lastimável desempenho da pequena Maísa no Programa Silvio Santos. A menina tinha sua intimidade invadida todo domingo e frequentemente era ridicularizada no palco. Uma exposição desnecessária que pode trazer sérias consequências para a garota.

Diante deste cenário, fica a pergunta: existe diversão saudável na TV aberta? A resposta é afirmativa. Basta sintonizar as redes públicas. Nelas, é possível encontrar opções inteligentes de entretenimento que podem contribuir efetivamente para o desenvolvimento das crianças. Outra boa alternativa são os canais pagos. O lamentável é que, aqui no Brasil, o acesso aos bons serviços é cobrado. Em outras palavras: filho de pobre tem que se contentar com as imbecilidades da Xuxa. Deve enfrentar as filas do SUS quando ficar doente e se submeter à educação precária da rede pública. Essa é a realidade do nosso país. Os humildes são nutridos pela ignorância e pelo total esvaziamento intelectual, desde muito cedo. A televisão, mais do que entreter, passou a cumprir um caráter educacional. Função que nunca foi dela. Assim, em vez de contribuir na formação dos indivíduos, a TV deforma esse processo. Quer saber mais? Pergunte para a Maísa.

terça-feira, 5 de maio de 2009

O Diário Secreto do Superpop.

Luciana Gimenez

A nova música de Rita Cadilac, o lançamento do filme pornô de Julia Paes, o mais recente hit de MC Créu, as confissões de Thamny Gretchen e a banheira erótica da Mulher Moranguinho: estas são algumas atrações do Superpop, exibido de segunda a quinta-feira por Luciana Gimenez. Há quase dez anos no ar, o programa aposta no grotesco e no sensacionalismo, com temas – e factóides – polêmicos, geralmente acompanhados de um ar kitsch de jornalismo investigativo. O ambiente perfeito para sub-celebridades armarem os seus barracos e discutirem futilidades, que, na maioria das vezes, não levam ninguém a lugar algum.

Em sua primeira fase, ancorada por Adriane Galisteu, o Superpop teve uma roupagem jovem, com tons explicitamente inspirados na cultura pop. O DJ Zé Pedro, com seu vestuário extravagante compunha um mix bastante divertido. Mesmo com um orçamento enxuto, a pauta era criativa e variada, atraindo, segundo pesquisas daquele ano, mulheres entre 25 e 40 anos e médias em torno dos 3 pontos, significativos para uma emissora iniciante.

Dez meses depois, Galisteu, sem aviso prévio, trocou a RedeTV! pela Record. O golpe foi tão imprevisto que uma solução de emergência teve de ser arquitetada. Assim, Otávio Mesquita e Fabiana Saba foram escolhidos para cobrir o buraco. De mãos atadas, os diretores sentenciaram que a escolha da substituta de Adriane seria anunciada por votação direta dos telespectadores. Além de Luciana Gimenez, várias opções foram cogitadas, como Monique Evans, Astrid Fontenelle, Susana Werner, Rita Lee, Luana Piovani e Cátia Fonseca.

Apesar de não ter sido a candidata mais votada pelo público - que elegeu Monique Evans como preferida - Luciana foi a felizarda "por se encaixar mais com o perfil do programa". Logo em sua estréia, a ex-modelo foi implacavelmente achincalhada por causa dos deslizes que cometia contra a língua portuguesa, fruto de doze anos de vivência no exterior. Em entrevista para a Revista TPM, a apresentadora mostrou ter superado todas as críticas: “Eu mudei do Brasil com 16 anos e perdi a fluência. As pessoas que ‘jo­garam pedra na Geni’, hoje se sentem cul­padas e têm um carinho extra por mim” - completa.

Questionada sobre a qualidade dos temas exibidos no palco, Luciana responde com ironia. Diz não se tratar de baixaria, mas de conflito social. Relembra, ainda, as importantes entrevistas e matérias que realizou. Destaques para Fernando Col­lor, Britney Spears, Bryan Adams, Mi­ck Jagger e Marta Suplicy. Defende também já ter privilegiado pautas de interesse público, como parto na á­gua, HPV e cân­cer de mama. Esses assuntos, contudo, não rendem bons índices no Ibope, segundo o parecer da apresentadora.

A receita da “popularidade” é previsível: sensacionalismo barato, manchetes chamativas e pautas extravagantes. Para acalorar o espetáculo, participam modelos, parentes de famosos, ex-BBBs, garotas de programa, médicos e especialistas, discutindo, juntos, temas polêmicos, como homossexualidade, prostituição, cirurgia plástica e religião. Às vezes, o debate toma rumos inadequados, com opiniões de quem pouco ou nada sabe do que está falando. Patético!

Outra característica reincidente é a predileção por certos convidados, como Thammy Gretchen. A filha da rainha do rebolado sempre entra em cena para abordar a sua orientação sexual: desabafo, desculpas à mãe, filme pornô gay, desejos e relacionamentos. Com intuito de apimentar a contenda, a produção escala alguns “antagonistas”, que se prestam a espezinhar a moça, com comentários homofóbicos. Arma-se, então, um barraco esdrúxulo, com direito à gritaria da platéia e às caras de bocas de Gimenez.

O programa conta ainda com vários outros quadros, como “O Diário Secreto”, um rascunho do “Arquivo Confidencial” do Faustão. Só que, em vez de Regina Duarte no papel de homenageada, o centro das atenções é Bruna Surfistinha. Há também os desfiles de moda, às quartas-feiras, em que moças desfilam lingeries no palco. A união perfeita do merchandising com o apelo erótico. Em seguida, entra Ronaldo Ésper, com a sua avaliação da roupa dos famosos. O estilista, depois do caso do roubo de vasos no cemitério, ganhou um pouco de senso do ridículo, mas não o suficiente para impedi-lo de dançar suas músicas. Por fim, tem o insuportável “Popparazo”, um rapaz que persegue as celebridades com a sua câmera. Nas imagens, flagras imperdíveis, como a Gretchen comendo pastel de carne, Vivi Fernandes tomando caldo de cana com um “suposto affair”, e outras pérolas do gênero.
Crééééu

Na tentativa de elevar o nível da atração, a RedeTV! buscou promover, em dias específicos, pautas jornalísticas e investigativas, como "Na mira da mídia”, um quadro que mostra apenas os casos mais conhecidos e batidos da semana. Destaque para a entrevista de Alexandre Jatobá, pai de Anna Carolina Jatobá, entrevistado sobre o suposto crime que a filha teria cometido. Outra edição controvérsia foi protagonizada pelos sargentos Laci Marinho de Araújo e Fernando de Alcântara Figueiredo. O interrogatório se transformou em um show, quando ao vivo, foi informada a prisão de Araújo pelo Exército.

Esta postura mais séria do Superpop, contudo, não cobriu com sucesso nem a proposta inicial de entretenimento, tampouco a cobertura de informações jornalísticas. Assim, a direção resgatou, sem grandes inovações, um velho formato, que fez muito sucesso em meados da década de noventa: a “banheira”. Em vez da água, todavia, apostaram em um novo ingrediente: o chantili. Tudo para justificar a presença da insinuante Mulher Moranguinho, incumbida de impedir com que os rapazes recolham as frutas. Um verdadeiro show pornô, com picantes closes ginecológicos. O mesmo esquema do falecido quadro do Gugu, mas em um horário bem mais permissivo.

O mais curioso é que o Superpop não é tão povão como sugere seu nome. Seu perfil é altamente qualificado, assistido diariamente por cerca de 250 mil telespectadores (só na Grande São Paulo), de clas­ses predominantemente A e B, segundo o Ibope. A audiência também é interessante, uma das maiores da RedeTV!. É o típico programa que as pessoas escondem acompanhar. Muitas delas se dizem abduzidas no momento do zapping. Pura balela! As madames também apreciam uma boa baixaria na TV, desde que salvaguardadas no silêncio de suas salas. O trash seduz. Quem nunca foi atraído que atire a primeira pedra.

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Mais casos, menos famílias.

Christina Rocha

O popularesco está de volta. Na tentativa de reverter o esvaziamento da audiência, Silvio Santos recorre à velha fórmula que consagrou o SBT: a exploração do apelo popular. Estilo que posicionou a emissora no mercado e, em pouco tempo, a elevou à categoria de vice-líder. A mesma diferenciação que espantou, por muito tempo, anunciantes de peso, fazendo a Rede operar no vermelho. Numa ofensiva contra o crescimento da Record, o canal ressuscita atrações que fizeram sucesso no passado: o “Programa do Ratinho”, o “Show da Gente” e o “Casos de Família”, o objeto desta análise. Uma estratégia comodista, preguiçosa e rançosa. A mesma que estimulou a estréia das malfadadas releituras de “Aqui Agora”, “Viva a Noite” e “Fantasia”. Apertem os cintos, o Patrão voltou no tempo e o piloto sumiu.

A partir do dia 4 de maio, diariamente, das 16h30 às 17h30, o SBT vai transmitir o novo “Casos de Família”, bem diferente da estrutura assistencial que a competente jornalista Regina Volpato levava ao ar. A ordem agora é chocar, inflamar discussões, armar o barraco. Saem os casos humanos narrados de forma civilizada, entram as gritarias. É o retorno de Christina Rocha, que acaba de sofrer uma verdadeira "venezuelização", já que a proposta é ser o mais fiel possível ao formato adquirido pela produtora Venezuelana.

Depois que Volpato abandonou o programa, desgostosa com as imposições que lhe foram feitas, o SBT partiu em busca de uma substituta que se encaixasse ao novo perfil. Com a saída de Regina, a emissora produziu pilotos com Olga Bongiovanni, Claudete Troiano, Márcia Dutra e Christina Rocha. A palavra final, como sempre, foi a de Silvio Santos, que elegeu a ex-apresentadora do “Aqui Agora” para ancorar a atração.

Historicamente, o programa apresenta perfil feminino, com predomínio das classes ABC e faixa etária acima de 25 anos. Um segmento bastante atrativo para o mercado publicitário. Estes dados, contudo, são referentes aos tempos de Volpato, que mediou a atração de maio de 2004 até março de 2009. Desde que estreou no comando de “Casos de Família”, Regina rompeu preconceitos e provou que é possível manter a elegância num “telebarraco” e não explorar o drama de pessoas humildes, que se prestam a contar na TV o que deveria ficar restrito às suas casas. A ordem agora, contudo, é seguir o caminho inverso: provocar escândalos, chamar atenção e atrair audiência, seja ela qual for. E o antigo telespectador? Será atraído pela nova proposta? E os anunciantes? Eles vão querer associar suas marcas a este tipo de conteúdo?


Ao que parece, o SBT está resgatando sua imagem popularesca, baseada numa programação de fácil aceitação pelo público. A mesma que lançou humorísticos quentes e shows intimistas, como "Reapertura", "Moacyr Franco Show", "O Homem do sapato branco", e o "Povo na TV", no início dos anos 80. Com tal direcionamento, a Rede alcançou rapidamente uma posição de destaque em audiência, chegando a uma participação de 24% e 30% no primeiro e segundo ano de operação.

Esses resultados estimularam uma mudança de postura. De 1983 a 1987, a emissora investiu em programas populares, mas já aliados a uma preocupação com a qualidade. Estratégia intensificada entre 1988 e 1990, com a contratação de Boris Casoy, Jô Soares e Carlos Alberto de Nóbrega. Nesse período estrearam "Aqui Agora", "Programa Livre", "Jô Onze e Meia”, "A Praça é nossa" e "Cinema em Casa". Com uma grade qualitativa, contudo, a Rede experimentou um decréscimo na sua participação em audiência, caindo para 22%. Em compensação, pulou para 15% de no share publicitário. Prova de que os números do IBOPE, a comercialização e o prestígio nem sempre andam juntos.

Em resposta à ascensão comercial da Record, a partir de 2004, o SBT tentou re-qualificar sua grade com maciços investimentos no jornalismo e na dramaturgia. Aos poucos, a emissora sofisticou seu casting e perdeu parte do apelo popular. Tal atitude, todavia, veio acompanhada de uma substancial queda na audiência.

Se antes aquele estilo pop do SBT tinha um ar cult, hoje envelheceu. Tornou-se apenas brega – o que explica em parte o esvaziamento da identidade da emissora. A estréia do novo “Casos de Família” é um desses exemplos desesperados de voltar no tempo. Troca o perfil, substitui a apresentadora. Muda também o telespectador qualificado, que migra para outras propostas mais interessantes – e cada dia mais escassas na TV aberta. Só falta contratarem o João Kleber para acelerar a metástase da grade vespertina, já convalescente desde o regresso de Márcia Goldschmidt. É o mundo cão ressurgindo das cinzas, mais forte do que nunca.

quarta-feira, 8 de abril de 2009

Big Brother Brasil: a voz dos excluídos.

Max, Fran e Pri: finalistas do BBB 9

Esta semana, o Brasil conheceu o mais novo vencedor do Big Brother: Max Porto. Com apertados 34,85% dos votos, o carioca venceu Priscila e Francine e conquistou o prêmio máximo do programa. De quebra, ainda terá seus 15 minutos de fama que, se bem administrados, podem render mais alguns rendimentos. Final feliz para o bem, punição para o mal (se é que esta edição teve algum vilão de fato) e a resolução de uma trama de conflitos que atraiu os sentimentos de compaixão e justiça em mais de 40 milhões de espectadores-consumidores. Enfim, os brasileiros podem começar o ano e tocar suas vidinhas adiante. A novela acabou e, com ela, todos os argumentos de luta, usados pelos participantes do jogo, para transpor as barreiras da vida e das armadilhas de seus adversários. O povo fez a sua parte. Endossou um investimento milionário que não vai levar ninguém a lugar algum.

O formato do Big Brother não por acaso tem os ingredientes de um melodrama. Os aspirantes à fama são escolhidos entre milhares de candidatos, por meio de uma seleção direcionada, pressupondo certos encadeamentos, já que eles foram eleitos segundo características físicas e emocionais preestabelecidas. Lá estão a mocinha, a gostosa, o bonitão, a chorona, os vilões e, como não poderia deixar de ser, os representantes das minorias.

Durante nove edições, os telespectadores assistiram a verdadeiras “tramas comportamentais”, com a real possibilidade de interagir com o enredo, punindo ou premiando a ação dos “brothers”, através de atividades programadas, como o “big boss” e a “votação popular”.

Ao longo dos paredões, os participantes foram assumindo seus personagens. Fato curioso é a predileção do público brasileiro pelas "minorias sociais". No BBB observa-se que os candidatos mais populares repetem um padrão de identidade associado a arquétipos de personalidade. Listemos os vencedores de todas as temporadas: o ignorante boa praça (Bam Bam), o rústico (Rodrigo Caubói), o caipira influente (Dhomini), a babá de bom coração (Cida), o intelectual gay (Jean), a mãe da menina com necessidades especiais (Mara), o herói (Diego Alemão), o feirante fiel (Rafinha) e, finalmente, o artista sincero (Max).

Cida: a primeira mulher a vencer o BBB
Margaret e Pearson (2001) definiram doze arquétipos que se expressam na vida das pessoas. Alguns deles são facilmente identificados nos participantes do programa. São eles: o prestativo (Mara, BBB 6); o governante (Jean Willis, BBB 5); o bobo da corte (Fran, BBB 9); o cara comum (Buba, BBB 4); o amante (Thyrso, BBB 2); o herói (Alemão, BBB 7), o fora-da-lei (Tina, BBB 2), o mago (Monge, BBB 6), o inocente (Bam Bam, BBB 1), o criador (Iris, Alemão e Fani, BBB 7); o explorador (Doutor Rogério, BBB 5) e, por fim, o sábio (Jean Massumi, BBB 3).

No Big Brother Brasil 5, Jean Willis inflamou o programa ao se declarar gay e denunciar homofobia dentro da casa. Na condição de "minoria oprimida", caiu nas graças do público e da crítica. O caminho adotado pelo psiquiatra Marcelo, na oitava edição do reality, contudo, foi diferente. De forma consciente ou não, ele buscou explorar a roupagem sexual mais adequada para ser aceito por seus pares. Ambas personalidades se destacaram na competição. O escritor baiano faturou a premiação da quinta temporada, vencendo, inclusive, Grazi Massafera. Um avanço e tanto para um país ainda homofóbico e preconceituoso.

Fazer parte da minoria, contudo, não é fator determinante para o jogo. Esta edição do BBB, por exemplo, contou com dois “brothers” da terceira idade: Naiá (61) e Norberto (63). Ambos foram eliminados pelo público, com 52% e 55% dos votos, respectivamente.

No Brasil, ao contrário das versões internacionais, o Big Brother costuma separar dois sub-grupos de personalidades: os “marginalizados” e os "aspirantes à fama", com seus biotipos esculturais e certo grau de arrogância ou isolamento. A seleção destes "excluídos", além do jogo cênico que proporcionam, tem uma explicação comercial muito clara: gera identificação com um público consumidor em franca expansão. As classes C, D e E, enfim, viram-se representadas na tela da Rede Globo. Desta vez no papel de herói da vida real. Com isso, esse estrato populacional passou a interagir com o programa, na esperança de compensar seus personagens favoritos da pobreza em que viveram ou pela vida difícil que tiveram. Vitória dos excluídos, da esperança e da demagogia. O Big Brother, mais que um microcosmo da realidade brasileira, tornou-se uma reação global a um ato de preconceito que nos revela que as minorias estão se dando conta de seu poder.

MARK & PEARSON (2001). O Herói e o Fora-da-Lei: como construir marcas extraordinárias usando o poder dos arquétipos. Cultrix, São Paulo.

segunda-feira, 30 de março de 2009

O filé mignon em tempos de vacas magras

E o faturamento vai bem, obrigado.

Todo início do ano é assim: calor, recesso escolar, viagens e carnaval. Motivos suficientes para tirar o telespectador da frente da televisão. No verão, alguns programas têm sua audiência reduzida em mais de 30%, o que pode comprometer seriamente o seu faturamento. Diante desta evasão, comum nesta época, as emissoras começam a repensar suas grades. Reprisar os melhores momentos das atrações durante as férias dos apresentadores, por exemplo, tornou-se um luxo inadmissível. Os índices desabam, bem como as veiculações comerciais e as ações de merchandising. A ordem agora é deixar edições inéditas pré-gravadas. O público já não engole qualquer coisa, ainda mais com um dia de sol como concorrente.

Com orçamento reduzido e audiência em dispersão, as redes de TV têm que usar e abusar da criatividade para gerenciar formatos que ocupem a programação de forma econômica e lucrativa. A Rede Globo, por exemplo, interrompe, de janeiro a abril, a sua principal linha de shows. Nos anos 90 esta lacuna passou a ser preenchida com filmes e minisséries. Na última década, contudo, a emissora encontrou sua galinha dos ovos de ouro: um formato de reality show que revolucionou os hábitos dos telespectadores brasileiros. Assim nasceu o BBB, um suculento filé mignon em tempos de vacas magras.

Em sua nona edição, o programa já mostra sinais de desgaste. A audiência, na casa dos 35 pontos, permanece como uma das maiores da Rede Globo, mas bem distante das versões anteriores, que atingiram médias de 45. A surpresa é que, do ponto de vista comercial, será a mais lucrativa de todas, com uma receita recheada de cotas de patrocínio, merchandising, anúncios, espaços vendidos na casa, assinaturas de pacotes na TV paga, chat em telefonia celular, entre outros.

O Big Brother tornou-se um produto altamente rentável porque que investe em outras plataformas além da TV aberta: sistema Pay Per View (BBB 24h), programa na TV fechada (na Multishow), telefonia celular (para voto e obtenção de áudio dos participantes) e internet (portal Globo.com). Juntas, formam uma receita milionária, capaz de equilibrar o faturamento da emissora mesmo em tempos de crise.

O BBB tem seus méritos. Vive se reinventando. Destaque para os editores e os roteiristas, que criam enredos interessantes, como uma telenovela, com vilões, mocinhos e tramas paralelas. Um dos grandes apelos deste formato, contudo, está na possibilidade oferecida aos fãs de intervir nos rumos da narrativa. Assim, a audiência interfere na construção do produto a ser consumido e – pasmem – paga por isso. Seja pela ligação de celular, na qual a Rede Globo tem participação, seja gerando grande volume de acesso na página da internet, que é revertido em receita publicitária para a Globo.com.

Com relação ao conteúdo, o BBB abre amplas discussões para críticas, debates e discussões. No aspecto comercial, entretanto, o formato é unânime. Ele substitui cinco programas da linha de shows, com custo bem menor. Dá mais audiência e fatura muito mais. Explora outras plataformas, novas mídias e interage com o público. Talvez não seja uma diversão tão saudável e ética, que agrega conteúdo à família brasileira. No mundo dos negócios, entretanto, esses valores são apenas meros detalhes.

terça-feira, 17 de março de 2009

Novos hábitos: a mudança no consumo das telenovelas brasileiras.

Demorou mas aconteceu. O consumo da telenovela brasileira, tão cultuada pelos quatro cantos do mundo, enfim se abriu para o mercado interno. O comportamento da audiência se diferenciou, dando espaço para produções segmentadas e novos formatos. A dramaturgia nacional evoluiu, ganhou novos personagens e até mesmo uma nova vilã, disposta a tudo para roubar uma fatia mais polpuda do mercado e desbancar uma liderança que perdura por décadas. Desenlaces surpreendentes, traições e disputas: a novela das novelas chega ao seu clímax com a promessa de muitas emoções para os próximos capítulos.

Caminho das Índias

Os personagens:

Vamos aos protagonistas. No papel principal, destaca-se a “heroína”, a Rede Globo, detentora de três novelas inéditas, uma reprise e um seriado adolescente. Uma emissora de forte apelo popular e reconhecimento por suas obras. No lado oposto, a antagonista Rede Record ataca com duas produções em curso e um repeteco nas tardes. Completando o triângulo, no núcleo cômico, encontra-se o SBT que, de modo quase que patético, transmite “Revelação”, escrita pela mulher do patrão. Há ainda os figurantes, que exibem melodramas importados, como a CNT, mas eles raramente aparecem no contexto.

A trama:
Flashback para ambientar a história e a rivalidade dos protagonistas: 1999. Tínhamos uma Rede Globo prepotente e invicta, com suas novelas em alta, faturando muito bem, com algumas ameaças do SBT, que freqüentemente emplacava algum “furacão mexicano”. Na Record, a dramaturgia nacional engatinhava, com produções baratas de retorno minguado.

A reviravolta:
No início dos anos 2000, o SBT ousou em firmar uma parceria com uma das maiores exportadoras de conteúdo do mundo – a emissora mexicana Televisa. Deste acordo, que durou oito anos de co-produções, surgiram alguns destaques, como “Pícara Sonhadora”, “Marisol” e “Esmeralda” que, embora tivessem textos sofríveis, garantiram médias significativas. Neste tempo, o SBT chegou a exibir no mesmo dia até seis novelas da Televisa (inéditas e reprises). Cômico se não fosse trágico.


Preparem os lenços: Alexandre Frota e Bárbara Paz

O clímax:
A ameaça à hegemonia das produções globais, contudo, não estava no SBT, mas sim na Rede Record, que a partir de 2004 passou a se utilizar da mesma fórmula da emissora líder. Desde que injetou cifras miliomárias em sua programação, a rede da Barra Funda entrou na dramaturgia disposta a investir pesado em elenco, em texto e em produção. O primeiro golpe foi apostar na ousadia: estreou em um domingo a telenovela “Metamorphoses”, em parceria com a produtora Casablanca. O resultado foi desastroso. Um enredo que se perdeu pelo caminho, obtendo índices irrisórios. A grande tacada, entretanto, viria logo a seguir, com a estréia do remake de “A Escrava Isaura”, que rendeu média de 13 pontos e picos de 25 em sua reta final.

O núcleo cômico:
Com o sucesso de “A Escrava Isaura”, a Rede Record engatou vários sucessos e investiu em novos horários e temas. Eis que surge o inusitado: uma trama romântica que tem como pano de fundo uma história que envolve mutantes. Com índices animadores, a Record engata uma segunda temporada, com um enredo que beira o absurdo, concorrendo direto com o principal produto da sua rival. Desde então, a novela global pena para chegar aos 40 pontos de audiência na faixa das 21h (sendo que a meta é 45).

Caminhos do Coração


Neste cenário de guerrilha entra em cena o atrapalhado SBT, que resolve investir na dramaturgia nacional e contrata Íris Abravanel, a esposa de Silvio Santos, para escrever uma trama recheada de improviso, amadorismo, pieguice e escracho, apesar de nada disso constar na sinopse original.

A análise por trás do enredo:
Esse melodrama dos bastidores das novelas é uma obra aberta. Portanto não há como supor o desfecho dos protagonistas. Pode ser que venha um furacão e elimine metade dos personagens e mude todo enredo, assim como fez Janete Clair em “Anastácia, a mulher sem destino”, em 1976. De repente, a antagonista pode vencer e se tornar absoluta com suas tramas. Ou mesmo ser esmagada pela líder. Há ainda a remota possibilidade de o núcleo cômico, encabeçado pelo SBT, se destacar com alguma palhaçada, “arma secreta” ou “espasmo criativo” do patrão.

A diminuição dos índices de audiência – ou a pulverização deles, melhor dizendo – não indica que a dramaturgia brasileira esteja em crise. Mostra que o telespectador está aberto a novas propostas e que o mercado televisivo, mesmo em meio a uma crise mundial, ainda está aquecido. Com isso todos ganham: o mercado anunciante, a equipe de produção, os investidores e o público. Final feliz. Até que alguém inove mais uma vez e invista em outros formatos mais rentáveis. Mas aí já é enredo para uma outra história.